Depois de 60 artigos em pouco mais de dois anos aqui no Terapia Política, nesta quinzena não escrevo um artigo comentando ou analisando algo, ou debatendo a conjuntura, ou ainda falando de economia. Neste momento, avalio que estamos em um importante momento de decisão, e achei mais importante declarar o meu voto: voto em Lula no próximo domingo, e torço para que a eleição presidencial termine nesse primeiro turno.
Não que pretenda convencer alguém. Acho que, quando esse artigo vier a público, boa parte das pessoas já estará decidida quanto a seu voto. E os poucos que ainda não estiverem decididos, não tenho nenhuma pretensão de os convencer. Espero que decidam pesando bem suas paixões e seus interesses.
Faço isso porque simplesmente acho que o Brasil não merece algumas coisas, e merece outras. E considero que este seja o momento certo para dizer isso, pois as pessoas estão mais atentas a essa discussão, estando prestes a exercer plenamente sua cidadania através do voto.
O país e seus cidadãos não merecem a armadilha para a qual foram empurrados a partir da crise política de meados da década passada. Passamos por rupturas institucionais, por crises econômicas graves, agudas em alguns momentos, crônicas em outros, por uma crise social ainda longe de terminar, e que trouxe de volta, entre outros sofrimentos, o dramático crescimento da fome e a insegurança alimentar para uma parte expressiva da população.
O país não merecia ter como seu principal gestor, durante a pandemia que atingiu o planeta, uma criatura alheia ao sofrimento de seus concidadãos, que foi o responsável pela morte de centenas de milhares de brasileiras e brasileiros a mais do que a fatura que já seria normalmente cobrada pela Covid-19, simplesmente pela ausência de medidas ou incapacidade de gestão.
O país não merece os arroubos antidemocráticos diários do atual presidente da República, que não perde uma oportunidade de desmontar diuturnamente os tijolos com os quais vamos tentando construir um país democrático e com alguma justiça social, com idas e vindas, nos últimos 40 anos.
O Brasil não merece um governo sem a menor preocupação com o meio ambiente do país e do planeta, e que não apenas não se preocupa com o tema, como atiça os destruidores do meio ambiente e faz vista grossa para sua ação deletéria em todos os biomas do país.
Não há solução mágica para resolver esse problema que foi criado a partir de fins de 2014 e aprofundado no governo atual, mas é fundamental perceber que o primeiro grande saldo seja recuperar a coesão nacional em torno da ideia de que ou resolvemos nossos problemas em um ambiente democrático, ou não temos futuro. E em uma democracia tem que caber a maioria, ou seja, não há como resolver nossos problemas com a fome e a miséria dos mais pobres, maioria absoluta de nossa população. Se seguirmos tentando condenar os brasileiros mais pobres à exclusão social e econômica, teremos que excluí-los também da política, e romper com a democracia. Nesse sentido, democracia e combate à miséria em um país como o Brasil estão inextricavelmente conectados.
Assumido esse ponto, nossa fraqueza, como um país com uma grande população pobre e necessitando de acesso a uma enorme quantidade de bens e serviços, vira força para a construção de um projeto econômico. Porque integrar essa enorme massa de brasileiras e brasileiros no processo econômico como consumidores de bens e numa infraestrutura de serviços sociais básicos como saúde, educação, acesso à água e saneamento, transporte, moradia, energia, comunicações e outros – serviços que devem ser universais e de qualidade – são processos que garantem o dinamismo da economia brasileira por um bom período. Quanto à nossa matriz de produção, também é fundamental trabalhar no sentido de melhorar muito o seu conteúdo ambiental, o que nos dá enormes possibilidades de crescimento no rumo de uma transição ambiental dessa matriz energética e de produção nacional.
E na questão ambiental, temos todas as condições de sermos bastante ativos, tanto do ponto de vista de preservar um projeto nacional atento ao meio ambiente, ambiente em que vivem parcelas importantes da população brasileira, como em sermos assertivos, a partir de nosso exemplo com ações, nessa discussão no cenário internacional.
Um país grande como o Brasil, em território e população, e com a diversidade de riquezas que temos, só pode seguir um rumo virtuoso no cenário internacional com soberania, que lhe permita definir a sua própria estratégia e não ser parte da estratégia de alguém. Neste sentido, a defesa da paz no cenário internacional e as possibilidades de caminharmos nesse sentido junto com nossos vizinhos da região, avançando em um processo de integração que nos permita ter voz e força no cenário internacional sem belicismos, também deve ser parte integrante desse projeto.
Nada disso se resolverá nesta eleição, e nem mesmo em um governo. A política tampouco se faz, assim como a vida, em situações ideais. Mas esta eleição é fundamental para afirmar que queremos os grandes rumos da democracia, e tudo que ela representa, ou pode representar, para o Brasil. Por isso, e sem ilusões, a hora é agora, e o nome é Lula.
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Ilustração: Mihai Cauli e Revisão: Celia Bartone